Durante décadas, o Itamaraty construiu uma reputação de neutralidade, mediando conflitos e cultivando o multilateralismo. Essa tradição começou a ruir nos governos do PT, com alinhamentos ideológicos que hoje se intensificaram no terceiro mandato de Lula. Especialistas alertam que a imagem de mediador confiável foi trocada por uma diplomacia polarizada, que se aproxima de regimes como Rússia, China e Irã.
A mudança não é apenas simbólica. A tarifa de 50% imposta pelos EUA às exportações brasileiras expõe o preço desse realinhamento. O Brasil, antes visto como “país pêndulo”, agora é percebido como aliado de potências que desafiam a hegemonia do dólar, elevando tensões com democracias ocidentais e ameaçando acordos comerciais vitais.
Historicamente, o Brasil usava o chamado soft power para projetar influência. Atuou como mediador na América do Sul e foi escolhido para liderar missões de paz da ONU no Haiti e no Congo, reconhecido por sua imparcialidade. Mas sob Lula, a diplomacia passou a abraçar causas políticas, enfraquecendo a busca por comércio e cooperação ampla.
A liderança brasileira no Brics cristalizou esse realinhamento. Na cúpula de 2025, o bloco formalizou planos de reduzir a dependência do dólar, algo visto por analistas como provocação direta aos EUA. A retaliação veio rápida, com Trump impondo tarifas recordes sobre produtos brasileiros, impactando setores como petróleo, aço e agronegócio.
Para o cientista político Rócio Barreto, o governo Lula radicalizou: critica a OTAN, ameniza atos de ditaduras, e rompe a tradição de diálogo amplo com parceiros. Já Elton Gomes, da UFPI, vê no atual governo uma política externa deliberadamente alinhada ao bloco sino-russo, repetindo no cenário internacional a polarização da política interna.
Nem todos os analistas, porém, veem um abandono total da neutralidade. Luciano Muñoz, do UniCeub, reconhece as dificuldades inéditas em manter esse equilíbrio num mundo mais conflituoso e polarizado, marcado por guerras, ascensão chinesa e personalismo diplomático.
Para recuperar credibilidade, especialistas afirmam que o Brasil precisará de uma política externa de Estado — que transcenda governos e evite mudanças bruscas a cada eleição. Mas admitem: esse resgate não deve acontecer no atual mandato. A reconstrução exigirá tempo, coerência e diplomacia profissional, capaz de separar interesses nacionais de paixões partidárias.
Assim, a diplomacia brasileira vive hoje um dilema: manter alianças ideológicas ou retomar a neutralidade pragmática que historicamente garantiu sua relevância e respeito no mundo.