Associações esperam regulamentação da cannabis medicinal em MG
Entidades que promovem o cultivo da maconha para fins terapêuticos querem ampliar acesso aos tratamentos com canabinoides.
Associações que promovem o cultivo medicinal de Cannabis sativa querem a regulamentação da atividade, de modo a ampliar o acesso a tratamentos com canabinoides e estimular pesquisas científicas com a chamada maconha terapêutica.
Em reunião realizada pela Comissão de Educação, Ciência e Tecnologia da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) nesta segunda-feira (14/7/25), representantes das entidades defenderam alterações no Projeto de Lei (PL) 3.274/21, que disciplina o fornecimento de medicamentos à base de canabidiol (CBD) pelo sistema público de saúde.
Os princípios ativos da cannabis (CBD, THC e CBG) têm eficácia comprovada no tratamento de diversas doenças, como autismo, Parkinson, Alzheimer, epilepsia, fibromialgia e dores crônicas. O PL 3.274/21, da deputada Beatriz Cerqueira (PT), tem o objetivo de garantir o acesso ao tratamento com medicamentos feitos com essas substâncias.
Em sua forma original, a proposição torna obrigatório o fornecimento, pelo Sistema Único de Saúde (SUS), de medicamentos à base de CBD para o tratamento de condições médicas debilitantes. O objetivo é beneficiar os pacientes que não têm condições de fazer a importação direta desses remédios nem de recorrer a um advogado para obter uma decisão judicial obrigando o seu fornecimento pelo poder público.
A matéria passou por alterações ao longo de sua tramitação em 1º turno. Conforme a modificação mais recente (substitutivo nº 2, da Comissão de Saúde), seria instituída uma política pública estadual com os objetivos de estimular a pesquisa científica sobre a cannabis para fins medicinais e garantir o acesso seguro ao tratamento com produtos feitos com a planta.
Os representantes das associações cobram o reconhecimento do trabalho das entidades e a garantia de recursos para o financiamento de pesquisas científicas. Em todo o Brasil, a atuação das associações beneficia 121.872 pacientes, segundo o Panorama Nacional do Setor Associativo da Maconha Medicinal.
“Hoje, se milhares de pessoas são atendidas com cannabis medicinal, é graças ao trabalho das associações. O Estado tem que olhar para essas entidades como fornecedoras de remédios à base de cannabis para o SUS”, defendeu Lucas Candini Soares, vice-presidente da Angatu, entidade com sede em Belo Horizonte.
Enquanto Minas Gerais ainda não tem uma lei estadual para autorizar o cultivo medicinal de cannabis, as associações precisam recorrer à justiça para obter esse direito. Este é o caso da Tijucanna, entidade sediada em Ituiutaba (Triângulo Mineiro).
A presidente da associação, Adriana Gomes de Moraes, reclamou que o “proibicionismo histórico” impede que o tratamento com cannabis chegue às pessoas que mais precisam. Segundo a ativista, a proibição impede o desenvolvimento de pesquisas científicas nas universidades locais.
“A gente atua onde o Estado não atua. A maioria da população brasileira tem renda muito baixa e não consegue ter acesso ao tratamento com a cannabis. Essas pessoas chegam cansadas e sem esperança, e a cannabis é a última alternativa para que elas tenham qualidade de vida.”
Adriana Gomes de Moraes presidente da Tijucanna
No entanto, as dificuldades enfrentadas não impedem o trabalho da Tijucanna, que fornece medicamentos a pessoas vulneráveis e acolhe pacientes com doenças graves e seus familiares.
Pesquisa científica prossegue, mesmo sem regulamentação
A ausência de regulamentação em âmbito estadual não impediu a realização de pesquisas científicas sobre o uso medicinal da maconha. O diretor da Associação Brasileira de Pacientes de Cannabis Medicinal (Ama-me), Leandro Cruz Ramires da Silva, apresentou os resultados de estudos que comprovam a eficácia do CBD no tratamento de diversas doenças.
O óleo de canabidiol conseguiu reduzir o número de convulsões em crianças com epilepsia refratária, na qual as crises persistem mesmo com o uso de medicamentos. Os pacientes pesquisados também tiveram redução na intensidade das crises convulsivas e ganhos importantes na evolução psicomotora.
Outra pesquisa conduzida pela Ama-me com crianças autistas concluiu que o CBD propiciou a melhoria de sintomas como insônia, comportamento anormal, convulsões, atraso no desenvolvimento motor e deficiência intelectual.
Segundo Leandro Ramires, esse estudo foi referendado internacionalmente e levou à liberação da cannabis medicinal na Tailândia. “E nós não conseguimos essa regulamentação em Minas Gerais”, lamentou.
Para desenvolver pesquisas com cannabis medicinal, a Universidade Federal de Viçosa (UFV) precisou recorrer à Justiça para obter uma autorização. O professor do Departamento de Agronomia da instituição, Derly Henriques, contou que serão cultivadas 5 mil plantas em uma área de 2,3 hectares.
O objetivo do projeto, batizado de Banco de Germoplasma, é desenvolver variedades estáveis de cannabis para a produção de canabinoides. A UFV também já realizou pesquisas com multiplicação de plantas por meio de clones. A expectativa do professor Derly Henriques é poder trabalhar com o cultivo a partir de sementes, o que permitiria estudar novas características das plantas.
FFO terá nova rodada de negociações
A presidenta da Comissão de Educação, deputada Beatriz Cerqueira, que solicitou a realização da audiência pública, informou que pretende realizar uma nova discussão sobre a cannabis medicinal na Comissão de Fiscalização Financeira e Orçamentária (FFO), a próxima que vai analisar o PL 3.274/21.
Ela defendeu que os movimentos sociais precisam se organizar para cobrar a aprovação do projeto. “Em geral, os parlamentos no Brasil não são progressistas e muitas vezes se contaminam por preconceitos e com pouca predisposição para escuta. Quando a sociedade não pressiona de fora para dentro, as dificuldades de aprovação de projetos como esse são muito maiores”, alertou.